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Capítulo 5 Realizando o diagnóstico educativo

5.1. Que perguntas faríamos?

Fatores que determinam a conduta

Uma vez que foram detectadas as condutas que deverão ser modificadas, é necessário analisá-las com maior profundidade a fim de identificar os fatores que influem sobre elas.

É necessário considerar os fatores externos e os fatores internos ao indivíduo. Os primeiros podem ser de caráter econômico (por exemplo: a renda), sociais (por exemplo: a legislação), climáticos (por exemplo: estação de chuvas), ou geográficos (por exemplo: natureza do solo).

Os fatores internos têm sido analisados por distintos autores. Segundo Leclercq, a conduta humana é afetada por 5 fatores: motivação, conhecimento, auto-estima, decisão e destreza (saber o quê fazer e como fazê-lo).

O primeiro dos fatores internos é a motivação. Somente um indivíduo motivado pode considerar a possibilidade de modificar uma conduta habitual ou de adotar uma nova conduta. Esta motivação é o resultado da tomada de consciência da importância de um problema, da percepção das conseqüências de sua conduta ou de uma conduta alternativa (Exemplo: a mãe toma consciência de que seu filho está com problema de saúde porque está desnutrido; ela reconhece a importância de modificar a alimentação diária da criança).

O segundo fator é o conhecimento. Quando o problema é percebido e existe suficiente motivação para realizar uma mudança, é muito importante saber que mudança é necessária. É nesta fase que intervém o conhecimento (Exemplo: a mãe convencida da necessidade de modificar a alimentação diária de seu filho, sabe o que é necessário fazer: aumentar a refeição, adicionando os alimentos adequados e aumentando o número de refeições diárias).

O terceiro fator é a auto-estima. Este fator tem adquirido grande importância para os educadores em saúde. Hoje eles compreendem que as mudanças de conduta em matéria de saúde são freqüentemente dificultadas pela falta de confiança dos principais implicados na ação em si mesmos. (Exemplo: mesmo que a mãe conheça os alimentos que pode preparar para seu filho, ela também necessita sentir-se capaz de prepará-los corretamente).

O quarto fator é a decisão, que tem relação com o sistema de valores da pessoa. Entre numerosas possibilidades, a pessoa deverá escolher a que mais lhe convém, segundo suas preferências. (Exemplo: uma mãe que confia em si mesma pode não mudar sua conduta simplesmente porque tem outras prioridades. Ela pode decidir não dedicar o tempo necessário para a preparação das refeições de seu filho menor. Isto pode não ser prioritário para ela. Entre várias soluções propostas, ela escolherá as mais adequadas ao seu sistema de valores e crenças e as de seu grupo de referência).

O quinto fator á a destreza, capacidade de saber o que fazer e como fazê-lo. Quando uma pessoa decide realizar uma mudança, experimenta-a primeiro, mas sua opção dependerá do resultado obtido. Se o resultado for positivo, continuará aplicando a nova idéia, mas se for negativo, surgirão dúvidas e a abandonará (Exemplo: uma mãe que decida provar uma nova receita para preparar os alimentos de seu filho, julgará o resultado da preparação quando esteja pronta. Se o resultado for positivo, seguirá usando a receita, mas se for negativo, não a usará mais.

O modelo de Leclerq não considera os fatores externos. É evidente que estes fatores influem sobre os padrões de conduta e as decisões.

Em alimentação e nutrição, os fatores externos são de importância fundamental: a disponibilidade de alimentos, o acesso aos serviços de saúde e a renda familiar são exemplos de fatores que podem impedir ou favorecer a adoção de uma conduta.

Entre os fatores que influem na implementação de uma ação, é indispensável identificar aqueles que dependem diretamente das pessoas implicadas e aqueles que, infelizmente, estão fora de seu controle. Os últimos podem ser tão poderosos que todo o esforço para modificar as condutas, sem considerá-los, levaria ao fracasso. (Exemplo: no caso de fome devido à seca, é muito difícil que as pessoas possam manter uma alimentação adequada se os alimentos necessários não estão disponíveis).

Em qualquer circunstância, é essencial compreender porque as pessoas se comportam de uma ou de outra forma. Em geral elas têm razões válidas (em sua opinião) para comportar-se de determinada maneira. É importante descobrir quais são essas razões antes de tentar fazer mudanças em seus hábitos.

Canais de comunicação

O segundo aspecto a ser tratado em um diagnóstico educativo concerne aos canais de comunicação. Em nutrição, a comunicação realiza-se mediante diversos canais, que podem ser interpessoais ou de meios de comunicação de massa.

As perguntas que devem ser respondidas são:

Estas perguntas podem ter respostas gerais, mas aquelas que têm relação específica com o campo da nutrição são particularmente importantes. Diversas pessoas e instituições podem, efetivamente, assumir um papel mais importante na comunicação em nutrição do que em outras áreas. (Exemplo: uma sogra ou a avó podem ter grande influência na alimentação da criança, a qual é financeiramente menos significativa na compra de alimentos da família.

5.2. Como realizar um diagnóstico educativo

Existem diversos métodos que podem ser utilizados para obter uma apreciação rápida da situação existente. Entre eles encontram-se a avaliação participativa rural rápida ou o procedimento de avaliação rápida (RAP) ou a avaliação etnográfica rápida (REA). O importante é selecionar o método mais apropriado em cada situação.

Os métodos propostos podem ser usados em uma variedade de situações, de acordo com as necessidades do programa.

Quando usados em conjunto, como parte de uma avaliação global para um diagnóstico educativo da população em risco, podem proporcionar um quadro muito claro da realidade da vida das pessoas.

5.3. Cinco métodos para reunir informações úteis

Como analisar os fatores que influem sobre as condutas associadas com a nutrição? Como identificar os canais “ativos” de comunicação em uma determinada comunidade?

As Fichas Técnicas 1 a 5 proporcionam diferentes opções para coletar informações, as quais, quando combinadas, permitirão à Comissão de Planejamento conhecer a realidade da população onde intervirá.

Além dos métodos de coleta de dados descritos, é possível juntar dados importantes, durante a execução da intervenção, através das opiniões e sugestões surgidas nas reuniões com grupos da população. Nas discussões de grupo suscitadas nesse nível, é recomendável estabelecer canais de comunicação em duas direções. Assim, antes de estudar os hábitos alimentares da população, é essencial tratar de compreender seu sistema de comunicação.

Ficha técnica No 1
Revisão da literatura

Qual é o propósito?
As questões relacionadas com a comunicação na comunidade, a saúde individual e a produção e consumo de alimentos, têm sido amplamente abordadas na literatura. Antes de iniciar novos estudos, muitas vezes de custo elevado, é aconselhável revisar a literatura, incluindo os relatos não publicados e todo documento acessível, já que neles pode-se encontrar resposta para grande parte das perguntas que surgem antes de iniciar um programa.
Como fazer?
A primeira etapa consiste em definir precisamente o quê se busca. A extensão do tema não deverá ser muito ampla. Exemplo: “o desenvolvimento agrícola do país” é um tópico sobre o qual existe grande quantidade de informação, que pode ser útil para o estudo do programa de comunicação. A área de estudo deveria estar centrada em três pontos principais: o campo de estudo, o contexto social ou geográfico e o período de interesse (por exemplo: "produção familiar de alimentos ricos em vitamina A, na região de Riobamba, Equador em 1990).
A segunda etapa consiste em identificar os lugares onde obter a informação. As bibliotecas e os centros de documentação têm uma dupla vantagem: o material já está classificado e contam com especialistas que podem ajudar na busca.
Os centros de documentação das Organizações Internacionais são um recurso valioso que não deve ser esquecido. Mesmo que grande parte do material disponível não tenha sido publicado, ainda é uma fonte muito útil de informação. As seções técnicas de institutos e ministérios também têm, freqüentemente, informações valiosas.
Como realizar a busca?
Existem duas formas básicas de conduzir a busca. Um método inclui a busca de indices bibliográficos de artigos recentes e estudos sobre o tópico em particular. Pode-se também revisar as referências bibliográficas citadas pelos autores das obras que se consideram de interesse.
A outra, é a busca sistemática nos catálogos das bibliotecas (autor, título, tópico, palavras-chave). Se o sistema está informatizado, a busca é bastante facilitada.
Pode-se acessar algumas bases de dados por meio do Modem. Elas permitem ao usuário um rápido acesso a referências que não estão disponíveis no país. Outros centros de documentação proverão informações que podem ser solicitadas por carta. Exemplos: Centro Latino-americano e do Caribe de Informações em Ciências Médicas (BIREME) Rua Botucatu, 862, Vila Clementino, CEP 04023-901, São Paulo, SP - Brasil; Centro Internacional da Infância da França (Chateau de Longchamps, Bois de Boulogne, 75016 Paris) e a Unidade de Documentação APHA nos Estados Unidos (APHA 1015 15th Street NW Washington DC 20005 USA).

Ficha técnica No 2
Entrevistas em um local de concentração de pessoas

Qual é seu propósito?
Estas entrevistas permitem uma rápida coleta de informações de um número significativo de pessoas, reunidas em um lugar específico por razões diferentes daquelas do inquérito.
Como fazê-las?
Trata-se de escolher um lugar onde se reúnem os membros da população-alvo. (Exemplo: pacientes em um hospital, mães de crianças pequenas nos centros de saúde materno-infantil, donas de casa no supermercado e outros).
É necessário preparar e experimentar um formulário específico para realizar as entrevistas. Estas não devem ser muito extensas, já que as pessoas, por não terem sido informadas previamente, provavelmente não gostarão de despender muito de seu tempo respondendo-as.
Os entrevistadores irão ao lugar selecionado e realizarão a pesquisa com pessoas que correspondam ao perfil requerido. Por exemplo, mães de lactentes, adolescentes do sexo feminino, ou outros. Como nestes locais geralmente se encontram muitas pessoas, será possível entrevistar um grande número delas, em um curto período de tempo. Esta é a principal vantagem do método.
Algumas pessoas estarão dispostas a responder às perguntas, enquanto outras se recusarão. Este é um primeiro viés da amostra. De qualquer modo, as pessoas entrevistadas em um local de reunião, não são verdadeiramente representativas da população-alvo, qualquer que seja o número de pessoas entrevistadas.
Mesmo quando as pessoas entrevistadas em um lugar público não são estatisticamente representativas da população-alvo, a amostra geralmente é maior que as empregadas nas exaustivas entrevistas pessoais ou de grupos focais. Por esta razão, este tipo de inquérito fornece informações úteis sobre a população que deve ser estudada.

Como usar os resultados?

Os achados do inquérito podem ser apresentados em forma de tabelas como a seguinte:

Exemplo 1: Descrição da amostra

 No %
Mulheres de 20 a 40 anos9660
Mulheres de 40 anos e mais6040
Total160100

Exemplo 2: As respostas

Existem diferenças entre as perguntas fechadas (o entrevistado deve escolher entre várias respostas propostas pelo entrevistador), e as perguntas abertas (o entrevistado responde livremente). É muito fácil apresentar as respostas às perguntas fechadas em uma tabela, já que tudo que se necessita é uma lista das respostas propostas e a freqüência de cada uma delas.

Exemplo: Você comprou feijão no supermercado hoje?

Sim3220%
Não12880%
Total160100%

As respostas às perguntas abertas são analisadas de forma diferente. Todas as respostas dadas pelas pessoas entrevistadas devem ser consideradas.

Exemplo: Que alimentos você comprou hoje no supermercado?

Feijão4025%
Peixe3220%

Exemplo: Por que você come peixe? (várias respostas são possíveis)

Porque gosto2870%
Porque é bom para minha saúde1640%
Porque está barato etc…1435%

Como apresentar as conclusões?

Como a amostra da população entrevistada não é representativa da populaçãoalvo, deve-se evitar generalizações. Sem dúvida, o resultado do inquérito pode permitir a formulação de hipóteses sobre certas condutas e suas causas.

Essas hipóteses podem ser provadas, realizando um inquérito CAP (conhecimentos, atitudes e práticas), usando uma amostra representativa da população estudada. O inquérito CAP será detalhado mais adiante.

Ficha técnica No 3
Entrevistas individuais em profundidade

Qual é seu propósito?
Certas pessoas, por suas atividades profissionais ou por sua posição na sociedade, possuem conhecimentos específicos sobre um determinado aspecto. As entrevistas individuais em profundidade com uma pessoa ou com uma amostra delas, durante uma hora ou mais, permitirão aprofundar o conhecimento do tema de interesse.
Como realizar as entrevistas?
As entrevistas individuais deverão ser conduzidas por pessoas bem treinadas e, se possível, pelos membros da Comissão de Planejamento. Com isto, tenta-se eliminar o risco de perder informações importantes.
O entrevistador deverá ser capaz de ganhar a confiança do entrevistado, de tal forma que este sinta-se livre para responder às perguntas que lhe sejam formuladas. O lugar onde se realiza a entrevista deve ser suficientemente confortável e privado para permitir um diálogo franco e direto. O diálogo nunca deverá ser interrompido de maneira brusca.
Estas entrevistas podem ser gravadas, se o entrevistado concordar, o que permitirá ao entrevistador concentrar-se mais na entrevista do que em anotar.
Como elaborar o roteiro da entrevista?
O entrevistador usa um roteiro elaborado em função dos objetivos que a Comissão de Planejamento propõe e usa perguntas abertas. Este roteiro semi-direto, possibilita organizar e formular as perguntas e fazer outras não previstas inicialmente durante a própria entrevista.
O roteiro é importante para manter a entrevista dentro dos limites do tema em questão. Contudo, deve-se considerar também a competência da pessoa que responde sobre o assunto.
Alguns exemplos de perguntas:
  • Quais têm sido suas experiências em atividades ou programas para prevenir a desnutrição nesta região?

  • Em sua opinião, quais são as principais causas da desnutrição das crianças menores de 5 anos nesta região (ou quais são os problemas específicos)?

  • Você acredita que existem hábitos ou práticas alimentares que contribuem para a má nutrição nesta região?

  • Podemos mudar alguns? Quais? Por quê?

As informações coletadas são de natureza qualitativa. As opiniões expressas pelos entrevistados geralmente são subjetivas. Por esta razão, a comissão concederá credibilidade aos achados dependendo de sua avaliação sobre a credibilidade da pessoa em particular.

Ficha técnica No 4
Grupos focais

Qual é o propósito?
Os grupos focais são utilizados para obter dados qualitativos sobre as opiniões, crenças, atitudes e valores relacionados a um aspecto ou tema específico.
Como realizar as sessões?
Com o roteiro de um facilitador bem treinado, convoca-se grupos de 8 a 13 pessoas para discutir um tema específico: consumo de alimentos, alimentação das crianças de 6 a 12 meses, aleitamento materno, etc.
Para serem produtivos, estes grupos devem ser homogêneos, fator que dá maior liberdade de expressão. Para determinar que caracteristicas importantes devem ser levadas em conta para assegurar a homogeneidade do grupo, é necessário considerar o tema específico a ser discutido. É essencial que o grupo não inclua pessoas com grandes diferenças de nível sócio-econômico, educacional, idade ou inclusive sexo. Os aspectos relacionados com a maternidade devem ser discutidos com diferentes grupos de mulheres: aquelas que têm filhos e as que não os têm. Aplica-se o mesmo a amostras relacionadas com a produção agrícola: é necessário diferenciar entre pequenos agricultores e os grandes proprietários de terras.
O facilitador constitui seus grupos de forma que reflitam a diversidade da sociedade que ele estuda. Entretanto, o objetivo não é obter uma amostra representativa. Pode-se verificar as novas informações que os grupos focais trazem sobre o tema tratado.
Exemplo:
Para estudar a resistência das mulheres ao uso de anticoncepcionais, em uma localidade rural, deverão ser formados 8 grupos focais, como se indica na seguinte tabela:

 Que usam anticoncepcionaisQue não usam anticoncepcionais
Mulheres alfabetizadas sem filhos1A1B
Mulheres analfabetas sem filhos2A2B
Mulheres alfabetizadas com filhos3A3B
Mulheres analfabetas com filhos4A4B

Foram considerados como critérios relevantes ao uso de anticoncepcionais, o fato de que as mulheres tivessem tido filhos ou não e a educação. Com base nisto, constituíram-se os grupos focais. Não é necessário formar todas as combinações possíveis. Se existem poucas mulheres analfabetas sem filhos, não é necessário formar um grupo com estas características.
Como elaborar o roteiro?
Para desenvolver o questionário que será utilizado durante uma sessão de grupo focal é necessário considerar os seguintes passos:
  1. Definir claramente os objetivos da investigação.
  2. Fazer uma lista das áreas temáticas para aumentar a probabilidade de coletar toda a informação requerida.
  3. Desenhar o roteiro, incluindo vários pontos de cada tema a ser estudado, para cobrilo adequadamente.
O roteiro deve ser testado e reformulado antes de ser usado nas sessões de grupos focais. O questionário é semi-estruturado e geralmente dura sessenta a noventa minutos. O facilitador deve ser flexível para se adaptar rapidamente à direção da discussão e modificar o conteúdo ou a seqüência das perguntas originais, se for necessário. O facilitador pode dirigir o grupo numa discussão do tema em profundidade, escutando cuidadosamente e tratando de determinar as razões das idéias expressadas.
O facilitador é assistido por uma pessoa que registra as idéias e opiniões e a maneira como elas são expressas. O uso de um gravador pode facilitar enormemente a análise das informações coletadas.
Como analisar as informações?
É necessário lembrar que os dados coletados são qualitativos. Um erro comum é generalizar a informação em afirmações como: “a maioria das pessoas pensa que…” ou “X porcentagem da população pensa que…”. Os dados coletados numa sessão de grupo focal são somente opiniões, úteis para entender as condutas da população ou para o desenho de mensagens efetivas, dirigidas para essas condutas. Portanto, os dados não podem ser usados para fazer generalizações sobre as caracteristicas da população estudada.
Em alguns casos, a opinião expressa por somente um indivíduo do grupo pode ser a informação mais útil para o programa. Em outros grupos, os comentários (verbais ou não verbais), sobre uma opinião expressa pelo membro de um grupo, pode resultar na mais pertinente.
O relatório sobre uma sessão de um grupo focal não precisa ser muito extenso. Ele deverá ajudar os comunicadores a entender porque as pessoas comportam-se de determinada maneira e quais são as razões subjacentes para esta conduta. Isto adicionará uma nova dimensão à compreensão destes fenômenos.

Ficha técnica No 5
A observação

Qual é o propósito?
Com razão, fala-se freqüentemente que as pessoas entrevistadas no decorrer de um inquérito orientado por um questionário dão as respostas que elas acreditam que o entrevistador espera ouvir. Este fenômeno de “prestígio social desejado” é, certamente, de menor importância entre as pessoas que são objeto de uma entrevista individual em profundidade ou de grupos focais.
Contudo, quando as pessoas falam sobre suas práticas, crenças e valores, elas distorcem a verdade para dar a seu interlocutor uma imagem favorável de si mesmas. Isto é e será inevitável.
A observação das atividades humanas fora de seu contexto é parcialmente superada pela observação das pessoas em seu meio normal. Este método demanda maior objetividade para descobrir e compreender a conduta humana.
Métodos
Deve-se distinguir claramente dois métodos de observação:
A observação participativa
Utiliza-se esta técnica em antropologia. Foi inicialmente apresentada por Malinowski em 1922. Desde então, tem tido muitos seguidores. Entre eles existem diversos antropólogos célebres. É impossível descrever em breves linhas uma técnica que requer extenso treinamento teórico e prático.
O pesquisador converte-se em parte da vida dos membros da comunidade cujas práticas deseja estudar. Enquanto vive na comunidade, observa a vida diária e faz anotações particulares. Interpreta continuamente os achados de suas informações, que servem de orientação para investigações futuras.
Explica-se o sucesso deste enfoque antropológico por seu perfil etnográfico que compreende uma completa descrição da comunidade, seu sistema social, suas crenças e seus estilos de vida. Para desenvolver este perfil, os antropólogos não baseiam seu estudo somente na observação, mas também em entrevistas em profundidade com “informantes” da comunidade que se estuda.
A observação sistemática
A observação sistemática de certas práticas é mais do que uma técnica etnográfica e antropológica. Trata-se de realizar um relatório detalhado de algumas condutas específicas. Por exemplo: as condutas sobre o aleitamento materno têm sido objeto de descrições detalhadas, comparando as diferentes condutas agregadas.
As técnicas de observação são muito objetivas: trata-se de contar a freqüência de ocorrência dos comportamentos, estabelecer a ordem em que aparecem, o tempo dedicado a cada um, etc.
Em ambas as técnicas, os observadores devem lembrar que sua presença pode afetar a conduta das pessoas que são observadas. Entretanto, mantendo um mínimo de discrição, os observadores podem ter sucesso, obtendo uma descrição aproximada da vida cotidiana.
O quadro da realidade revelado por estas técnicas é tão verdadeiro quanto se pode esperar, mais do que com qualquer entrevista conduzida por um questionário.
Como analisar os resultados?
Ambos os métodos podem proporcionar informações úteis para a preparação de uma intervenção nutricional.
A observação participativa ajuda a situar as práticas em seu contexto cultural e, assim, obter uma melhor compreensão de suas causas subjacentes. Também capacita os planejadores a predizerem melhor os efeitos da mudança dessa práticas.
A observação sistemática ajudará a prover uma explicação detalhada das condutas e das vantagens e desvantagens de cada uma delas.
Inclusive a análise do comportamento mais insignificante facilita a definição da mensagem apropriada para estimular uma determinada conduta.

5.4. Inquéritos CAP

O inquérito CAP procura determinar o conhecimento (C), as atitudes (A) e as práticas (P) de uma população. Baseia-se num questionário utilizado com uma amostra representativa da população estudada.

O inquérito CAP também pode ser usado na avaliação de um programa. Neste caso, o inquérito é realizado antes e depois da intervenção.

Para distinguir os efeitos da intervenção, é necessário aplicar o mesmo inquérito em um grupo controle, isto é, em uma comunidade não exposta à intervenção.

Tem-se feito várias críticas aos inquéritos CAP:

Contudo, é importante lembrar os elementos essenciais do inquérito CAP:

1. O questionário deve ser formulado cuidadosamente. Geralmente é composto por questões fechadas para facilitar a análise dos dados e é o resultado de um longo trabalho preparatório. Trata-se de identificar as perguntas pertinentes (os achados dos métodos qualitativos de investigação antes descritos podem ser úteis). As perguntas necessitam ser formuladas, testadas e corrigidas antes de que o questionário final esteja pronto.
A extensão do questionário deverá ser adaptada ao tempo que os entrevistadores podem dedicar à pesquisa. O questionário deverá se basear nos objetivos do estudo. As perguntas não relacionadas com os objetivos do estudo deverão ser eliminadas.
2. A amostra deve ser representativa da população em estudo. Para extrapolar as conclusões para a totalidade da população, a margem de erro usada para determinar a amostra deverá ser pequena. O tamanho da amostra será suficientemente amplo e a amostra deverá ser aleatória. Requer-se algum conhecimento ou assessoria estatística para cumprir com essas duas condições.
3. É imprescindível contar com uma organização rigorosa. Os entrevistadores deverão ser bem treinados e a entrevista padronizada, pois, do contrário, as fontes de viés do entrevistador afetarão significativamente os resultados do estudo.
4. Deve-se dar um tratamento rápido e eficiente aos dados colhidos. O manejo e a análise informatizada dos dados é preferível ao tratamento manual, já que aquela é muito mais eficiente. Considerar, por exemplo, os meses de trabalho árduo que se necessitaria para analisar manualmente 20 mil perguntas (40 × 500 pessoas).

5.5. Seleção de um método

Não existe um único método para a melhor coleta de dados. Cada método tem suas vantagens e limitações. Com freqüência, a combinação de vários métodos oferece os melhores resultados. A Ficha Técnica No 6 é uma comparação de 6 métodos de coleta de dados, segundo 6 critérios. A seleção de uma combinação particular de métodos depende dos objetivos do estudo e dos recursos disponíveis.

Ficha técnica No 6
Comparação de 6 métodos de coleta de dados para o diagnóstico educacional

 A. Tipo de dados coletadosB. Nível de competência requeridoC. Tempo necessárioD. CustoE. Possíveis dificuldadesF. Limitações
1. Revisão da literaturaOs dados disponíveis na literatura variam de um país para outro, mas podem dar muito mais informações do que o esperadoBom conhecimento do tema no qual se realiza a revisãoPoucos dias ou semanas, dependendo do tema em questãoBaixoAs vezes, as informações não são muito acessíveis, especialmente em áreas foras da cidadeNem sempre se pode determinar a validez e a confiabilidade dos dados obtidos
2. Entrevistas realizadas em um local de concentração de pessoasOs dados podem ser colhidos de um número significativo de pessoas, em um lugar muito freqüentado pela população-alvoOs entrevistadores devem ter recebido treinamento básico. Supervisores capazes de assessorá-los e de analisar os dados colhidosPoucos dias, em tempo integralBaixoFalta de disposição das pessoas para participar das entrevistasNão são estatisticamente representativas, apesar da valiosa informação que se pode coletar. Os dados podem ser superficiais
3. Entrevistas individuais em profundidadeDados colhidos de um grupo limitado de pessoasOs entrevistadores devem ter um bom conhecimento sobre o tema, serem capazes de conduzir entrevistas em profundidade e de analisar os dados colhidosPoucos dias ou semanas, dependendo do número de pessoas a entrevistarBastante caroIdentificar “bons” entrevistadoresEnfoques subjetivos da situação
4. Grupos focaisDados colhidos de grupos de pessoas da população-alvoFacilitadores e relatores treinados para moderar a discussão, a observação e o registro, assim como para analise dos dadosPoucas semanasEconômico, se não se realizam muitas sessõesDeterminar o número e a composição dos grupos. Recrutar os participantes. Favorecer a livre expressão. Interpretar os dadosNão são estatisticamente representativos, seja qual for o número de entrevistados
5. Técnicas de observaçãoDados obtidos da observação direta de domicílios selecionados e interpretados junto com as informações colhidas nas entrevistasOs pesquisadores devem estar bem treinados; necessita-se de antropólogos sociais caso se requeira um perfil etnográficoVárias semanas, inclusive mesesMuito caras pelo nível requerido e pela duração do trabalhoPoder enfocar adequadamente os elementos de observaçãoViés devido à percepção que as pessoas entrevistadas têm do entrevistador
6. Inquéritos de campoDados obtidos de uma amostra estatisticamente representativa da população-alvoDestreza para elaborar os questionários, definir a composição e o tamanho da amostra, conduzir o inquérito e para a organização e análise estatística dos dadosVários mesesMuito carosConclusão do processo sem omissão dos passos necessáriosViés devido a desejos de prestígio social. A informação pode ser superficial

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