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2. ESTATÍSTICAS DE DOENÇAS PROVOCADAS PELO PESCADO

A verdadeira incidência das doenças transmitidas por produtos alimentares não é conhecida. Há muitas razões para este facto. Na maior parte dos países não há obrigatoriedade de relatar às autoridades de saúde pública as doenças provocadas pela ingestão de alimentos. Nos poucos países que dispõem de um sistema de registo há muita falta de informação. Estima-se que apenas 1% dos casos relacionados com doenças alimentares está registado (Mossel, 1982). Isto é devido ao facto de que nem a vítima nem o médico estão conscientes do papel etiológico dos alimentos. Além disso, o alimento responsável nem sempre está disponível para análise e o veradeiro meio utilizado pelo agente da doença não é identificado. As estatísticas referidas a seguir servem, por conseguinte, apenas para identificar tendências e as áreas de maior preocupação.

Entre 1973 e 1987, foi registado, nos Estados Unidos, um total de 7 458 surtos de doenças provocadas por alimentos, envolvendo 237 545 casos (Bean e Griffin, 1990). Apenas em 3 699 surtos (50% do total) foi identificado um alimento específico como veículo da doença. Destes produtos alimentares, o pescado foi o alimento mais frequentemente associado à ocorrência de doenças como está indicado no Quadro 2.1.

Quadro 2.1. Tipos de alimentos associados a incidentes1) com doenças relacionadas com a alimentação.
AlimentoUSA2)
1973–1987
Canadá3)
1982–1983
Holanda
1980–1981
N.°%N.°%N.°%
Pescado75310,11487,6608,7
Carne (vaca e porco)5797,840420,79113,2
Aves domésticas2533,41949,9182,7
Vegetais2413,31387,1152,2
Ovos380,540,210,1
Produtos de padaria1001,31517,7273,9
Lacticínios1582,11578,1365,2
Outros157721,149625,443563,3
Total conhecido5)369949,6169286,768399,5
Desconhecido375950,425913,330,5
Total7458100,01951100,0686100,0

1) Um incidente é um surto (2 ou mais pessoas que adoecem) ou um caso envolvendo apenasuma pessoa.
2) Dados fornecidos por Bean e Griffin (1990).
3) Dados fornecidos por Todd (1989a).
4) Dados fornecidos por Beckers (1986).
5) Total de incidentes para os quais os veículos foram identificados.

Num período de dois anos (1980-1981), 8,7% da totalidade dos surtos na Holanda forma de origem alimentar (Beckers, 1986). Contudo, Turnbull e Gilbert (1982) salientaram que, frequentemente, não são identificados alimentos específicos envolvidos em incidentes provocados pela ingestão de comida estragada. Porém, nos casos em que tal aconteceu, registou-se que o pescado e o marisco estavam implicados em menos de 3% da totalidade dos incidentes, gerais e familiares, registados na Grã-Bretanha. As taxas de incidência referidas anteriormente devem ser avaliadas, considerando a totalidade do consumo de produtos alimentares. Assim, no mesmo período e nos Estados Unidos, o consumo de carne era, aproximadamente, 10 vezes superior ao de peixe e o de aves cerca de 5 vezes superior ao de peixe (Valdimarsson, 1989).

No Quadro 2.2. encontram-se os agentes etiológicos associados ao elevado número de surtos de doenças provocadas por produtos alimentares, registadas nos Estados Unidos no período entre 1973 e 1987.

Quadro 2.2. Agentes etiológicos associados a 7458 surtos (envolvendo 237545 casos) de doenças relacionadas com o consumo de alimentos de acordo com os dados do Center for Disease Control, em Atlanta nos Estados Unidos 1973–1987. Informações segundo Bean e Griffin (1990).

 Agente da doençaSurosCasos
N.°%do
total
%dos surtos
elucidados
N.°%do
total
%dos casos
elucidados
Bactérias patogénicas1 8752566108 7454687
Vírus142251124959
Parasitas142251 250<11
Biotoxinas5117182 50012
Produtos químicos171261 250<11
Desconhecidos4 61762-112 55147-
Total7 458100100237 545100100

Na maioria dos surtos (62% do total), o agente da doença não foi identificado. Uma razão apontada para este facto pode atribuir-se à falta de uma ténica de uma técnica de identificação adequada principalmente no caso dos vírus. Quando a identificação do agente etiológico é bem sucedida, os agentes de doença mais frequentemente identificados são as bactérias patogénicas.

No perído compreendido entre 1970 e 1984, as doenças associadas a vários tipos de pescado foram analisadas por Bryan (1980, 1987). Este autor verificou que o “peixe” era frequentemente o mais associado à ocorrência das doenças seguindo-se os moluscos bivalves e os crustáceos. Infelizmente, os relatórios disponíveis não incluem informações em relação ao tipo de produtos de pescado que foram os veículos de surtos de doenças. O conhecimento dos princípios de conservação envolvidos (aw, pH, fumagem, conservantes, etc.), embalagem e preparação antes do consumo (cozedura) seriam de grande utilidade para avaliar os perigos relacionados com os vários tipos de pescado.

Um número considerável (18%) de surtos de doenças relacionadas com o consumo de “peixe” registadas nos Estados Unidos era de etiologia desconhecida (ver figura 2.1.). As mais comuns eram intoxicações relacionadas com biotoxinas (ciguatera) e histamina que são responsáveis por dois terços do total dos surtos relatados. As restantes (18%) eram causadas por vários tipos de bactérias, parasitas, vírus e produtos químicos.

Figura 2.1

1) Este grupo inclui: Intoxica ç ão por estafilococos Shigelose Infeção por Anisakis Gastrenterite por C.perfringens Salmonelose Infecção por Strept. pyogenes Infecçã por cátodos Cólera Febre tifóide Envenenamento por baiacu Gastrebterute por V. parahaemolyticus Heparite não-B Envenenamento por produtos químicos

Figura 2.1. Doenças transmitidas por peixe, nos Estados Unidos, entre 1970 e 1984. (Número de surtos; %). Informações segundo Bryan (1980) e Bryan (1987).

Um total de 157 surtos, ocorridos nos-Estados Unidos, está relacionado com o consumo de moluscos. A maior parte dos surtos era de etiologia desconhecida (ver figura 2.2.). Este facto deve ser explicado tendo em conta as grandes dificuldades que há em diagnosticar algumas das doenças virais. Embora, apenas alguns dos surtos apresentados na figura 2.2. sejam provocados por vírus, não há dúvida que a maioria das doenças relacionadas com moluscos é, principalmente, de origem viral.

Nos Estados Unidos, entre 1970 e 1984, os crustáceos estiveram implicados, como veículo de transmissão de agentes patogénicos, num total de 63 surtos. Mais de um terço destes surtos era de etiologia desconhecida, mas quando o agente da doença foi identificado, era sempre uma bactéria patogénica (ver figura 2.3).

Num estudo posterior, Bean e Griffith (1990) analisaram os agentes etiológicos e os veículos alimentares associados a 7 458 surtos (envolvendo 237 545 casos) de doenças relacionadas com a ingestão de alimentos, segundo os dados do Center for Disease Control, Estados Unidos, no período compreendido entre 1973 e 1987. O agente da doença foi identificado em apenas 2841 surtos, como está apresentado no Quadro 2.2.

Figura 2.2

Figura 2.2. Doenças transmitidas por moluscos nos Estados Unidos de 1970 a 1984. (Número de surtos; %). Informação segundo Bryan (1980) e Bryan (1987).

Figura 2.3

Figura 2.3. Doenças transmitidas por crustáceos nos Estados Unidos de 1970 a 1987. (Número de surtos; %). Informações segundo Bryan (1980) e Bryan (1987).

Quadro 2.3. Agentes etiológicos associados ao consumo de peixe (540 surtos) e de marisco (213 surtos) como veículos em surtos de doenças relacionadas com o consumo de pescado nos Estados Unidos, no período entre 1973 e 1987. In formação e Griffith (1990).

Agente da doençaSurtos
Peixe(%)Marisco(%)
Bactérias patogénicas10,017,0
Vírus0,25,2
Parasitas1,00,0
Biotoxinas80,09,8
Produtos químicos0,70,5
Desconhecido8,167,5

Os dados apresentados no Quadro 2.3. confirmam que as doenças com origem no consumo de produtos da pesca e transmitidas pelo peixe estão relacionadas, antes de mais nada, com biotoxinas e bactérias patogénicas enquanto que na maioria das doenças transmitidas por marisco o agente da doença não identificado, mas era, provavelmente, de origem viral.


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