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Uso de biomassa florestal para geração elétrica em grande escala: O projeto "WBP-SIGAME" brasileiro.

Luiz Augusto Horta Noqueira. Profesor Escola Federal de Engenharia de Itajubá, Instituto de Mecânica, Itajubá/MG, Brasil

Resumo

Este trabalho apresenta a motivação e os condicionantes considerados para o desenvolvimento do Projeto WBP-SIGAME, que reúne entidades brasileiras e internacionais com o propósito de conceber, desenhar e implantar uma planta termelétrica com ciclo combinado empregando biomassa lenhosa gaseificada, com uma capacidade cerca de 30 MW. São apresentados considerações sobre a filosofía do empreendimento, suas principais características e as questões ambientáis envolvidas, bem como as perspectivas e oportunidades desta tecnología, incluindo-se um levantamento dos custos de capacidade para estas sistemas.

Introdução

O contínuo crescimento da demanda de energia elétrica no Nordeste brasileiro determinou a realização de estudos de disponibilidade energética, que apontaram a potencialidade da biomassa como combustível para geração termelétrica nesta região (BRASCEP, 1987). Contudo, tal vetor energético comporta diversas rotas diferentes para sua conversão em eletricidade, como os ciclos a vapor, onde a biomassa é queimada em geradores de vapor e os ciclos dos motores alternativos, utilizando sistemas de gaseificação de variada complexidade. Recentemente tem sido propostos também os ciclos com turbinas a gás, como se discute neste trabalho, considerando um projeto brasileiro em desenvolvimento, o Projeto WBP-SIGAME.

Os ciclos com turbinas a gás empregando biomassa representam uma alternativa promissora para a geração de potência. Estes ciclos consistem essencialmente na combinação de um gaseificador de biomassa com a tecnologia das turbinas a gás, apresentando altas eficiências térmicas e baixo custo unitário de capital em escalas moderadas de capacidade. As turbinas a gás apresentam-se desenvolvidas e consolidadas para aplicações com gás natural e combustíveis líquidos de boa qualidade, mas aspectos econômicos tem induzido esforços visando o uso de combustível sólido gaseificado em tais ciclos. Neste sentido tem sido notáveis os esforços e os resultados já obtidos considerando o carvão mineral, mas a biomassa apresenta também uma potencialidade indiscutível, particularmente para países que dispõem de clima adequado e superfície para cultivos energéticos. Além disso, o processo de gaseificação da biomassa, seja madeira ou bagaço, requer níveis de temperatura inferiores aos impostos pelos combustíveis fósseis e tem como contrapartida à eventual formação de cinzas alcalinas volantes, a virtual ausência de gases sulfurosos, uma vantagem ponderável. A produção de gases combustíveis a partir da biomassa permite sua aplicação a ciclos térmicos com turbina a gás, acionadores primários de elevado desempenho, inclusive sob capacidades unitárias de produção de energia elétrica da ordem de dezenas de MW. Em todas as situações, os requerimentos de ar e vapor para o gaseificador são obtidos por sangria na turbina a gás e recuperação de calor dos gases de combustão. Denomina-se usualmente como ciclos BIG os ciclos que associam gaseificadores de biomassa com turbinas a gás (Biomass Integrated Gasification), correspondendo a sigla STIG às turbinas com injeção de vapor (Steam Injected Gas Turbine). Em Nogueira et alli (1995) apresenta-se uma detalhada análise do desempenho destes ciclos, segundo quatro configurações distintas.

A aplicação da biomassa em turbinas a gás tem sido proposta também através da combustão direta na câmara de combustão da turbina. Esta tecnologia vem sendo tentada há anos, contudo os resultados não têm sido promissores, especialmente devido ao alto teor de partículas e cinzas nos produtos de combustão, limitando significativamente o desempenho e a confiabilidade destes sistemas energéticos, como mostra a literatura (Hamrick, 1992). Por outro lado, a tecnologia da gaseificação ainda que não totalmente comprovada, é considerada com melhores perspectivas e vem recebendo grande atenção dos estudiosos da área (Willians & Larson, 1993 e Kurkela et alli, 1991). Outra possibilidade interessante está associada ao uso do bagaço de cana, em esquemas de cogeração (Walter et alli, 1994).

O potencial para a obtenção de altas eficiências térmicas nas turbinas a gás deve-se ao fato de que a temperatura máxima do ciclo em tais turbinas é bastante elevada, sendo muito superior à temperatura máxima nos ciclos com turbinas a vapor. Estas condições mais moderadas de temperatura em ciclos à vapor, particularmente nas plantas de biomassa, se impõem principalmente devido à forte influência sobre seu custo de capital, pois o aumento da temperatura máxima e da pressão do fluido de trabalho acarreta uma maior sofisticação e encarece o equipamento, exigindo por exemplo, uma maior qualidade dos aços e uma maior pureza na água de alimentação. Em contraste com o ciclo a vapor, os custos de investimento unitário de ciclos a gás são relativamente baixos, e em conseqüência, a turbina a gás é uma opção interessante para geração de potência a partir de biomassa, especialmente na gama de algumas dezenas de megawatts.

Gaseificação da Biomassa

A energia química da biomassa pode ser convertida em calor e daí em outras formas de energia, mediante duas rotas básicas: direta, através da combustão na fase sólida, ou indireta, quando através da pirólise, são produzidos gases e/ou líquidos combustíveis. A combustão direta é conhecida e praticada desde tempos imemoriais, enquanto os processos indiretos, como a gaseificação e liquefação, foram desenvolvidos apenas a partir de meados do século passado.

O processo de produção de um gás combustível a partir da biomassa pode ser considerado como composto por três etapas distintas: secagem, pirólise ou carbonização e a gaseificação propriamente dita. A secagem ou retirada da umidade pode ser feita quando a madeira é introduzida no gaseificador, aproveitando-se a temperatura ali existente, contudo a operação com madeira seca é mais eficiente. Durante a etapa de pirólise formam-se gases, vapor d'água, vapor de alcatrão e carvão, e na etapa de gaseificação é liberada a energia necessária ao processo, pela combustão parcial dos produtos da pirólise. Assim, o processo de gaseificação da biomassa, como da madeira, consiste na sua transformação em um gás combustível, contendo proporções variáveis de monóxido de carbono, dióxido de carbono, hidrogênio, metano, vapor d'água e alcatrões. Esta composição do gás combustível depende de diversos fatores, tais como, tipo de gaseificador, introdução ou não de vapor d'água, e principalmente do conteúdo de umidade da madeira a ser gaseificada.

A gaseificação da biomassa e posterior utilização do gás combustível, é segundo D'Ávila e Makray (1981), o processo de conversão mais eficiente da energia da biomassa em energia final, apesar das perdas de energia na produção de gás combustível. Assim, considerando-se as eficiências globais de aproveitamento do combustível, a gaseificação é um processo energeticamente competitivo com a combustão direta, com as eficiências globais situando-se na faixa de 60 a 75% para a combustão direta convencional e entre 65 e 80% para a gaseificação. Assumpção (1981) cita ainda algumas vantagens do sistemas gaseificação-combustão sobre o sistemas de combustão direta, além da maior eficiência energética:

- as cinzas e o carbono residual permanecem no gaseificador, diminuindo assim a emissão de particulados;

- o combustível resultante é mais limpo e, na maioria dos casos não há necessidade de controle de poluição.

Uma discussão dos tipos de gaseificadores e suas características, incluindo os temas fundamentais da pressão de operação e do tratamento e limpeza do gás para utilização em turbinas a gás, pode ser encontrada em Nogueira et alli (1995). O atual nível de conhecimento dos gaseificadores atmosféricos é superior ao atingido no caso dos gaseificadores pressurizados, onde persistem dificuldades nos sistemas de alimentação de combustível, embora possam apresentar um desempenho energético algo superior.

O Projeto WBP-SIGAME: aspectos gerais

Como principais referências para este tópico e os seguintes, tomaram-se os trabalhos dos responsáveis pelo projeto, (Cunha Filho et alli, 1995 e Leão et alli, 1995). O projeto Wood Biomass Project/Sistema Integrado de Gaseificação de Madeira para Produção de Eletricidade (WBP/SIGAME), foi iniciado em julho/91 e tem como núcleo a implantação de uma Usina de Demonstração, com capacidade instalada de aproximadamente 30 MW e comissionamento previsto para ser iniciado em 1998. O projeto visa demonstrar a viabilidade comercial da geração de eletricidade, a partir da madeira (biomassa florestal), através da utilização da tecnologia de gaseificação integrada a uma turbina a gás, operando em ciclo combinado e é o resultado da soma de interesses de um grupo de empresas e de órgãos do governo brasileiro, no desenvolvimento desta tecnologia, associando-se ainda aos objetivos de preservação ambiental do Global Environmental Fund (GEF), das Nações Unidas.

A conjugação de tais interesses permitiu que o MCT - Ministério de Ciência e Tecnologia brasileiro e consórcio de participantes, formado pela ELETROBRÁS - Centrais Elétricas Brasileiras ("holding" das empresas estatais de energia elétrica), CHESF - Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (estatal de área de energia elétrica e coordenadora do projeto), CIENTEC - Fundação de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (instituição estadual de desenvolvimento tecnológico), CVRD - Companhia Vale do Rio Doce (estatal da área mineral e florestal) e SHELL (empresa energética multinacional), recebessem uma doação de $EE.UU. 7,7 milhões para o desenvolvimento de equipamentos, da engenharia básica da planta de demonstração, e preparação da sua implantação, etapas consideradas a Fase II do projeto, atualmente no final de sua execução.

Na Fase III, a implantação da usina, o GEF deverá alocar também sob a forma de doação, recursos da ordem de $EE.UU. 23,0 milhões, ficando o capital restante de aproximadamente $EE.UU. 47,0 milhões, para ser levantado entre os demais participantes, novos investidores interessados no projeto e/ou através de empréstimo. Durante a atual Fase II, além do desenvolvimento de equipamentos e da engenharia básica da usina, os participantes deverão formar uma nova empresa, através de um Consórcio, de preferência de caráter privado, que será responsável pela implantação da Fase III e pela negociação dos contratos de venda de energia e compra da madeira.

Os estudos realizados pela CHESF, levando em consideração o solo, o clima e as espécies indicadas para reflorestamento no Nordeste brasileiro, mostram que cerca de 33% do seu território pode ser usado para a implantação de florestas e que a produtividade anual alcançada nessas áreas varia de 10 a 30 m³ sólido/ha. Nessas condições, considerando a utilização da tecnologia da gaseificação da biomassa associada com turbinas a gás, o uso de 5% da área do NE, ou 15% da área com aptidão florestal, resulta num potencial de geração de cerca de 19,7 GW médios, ou seja, mais que o dobro do potencial hidráulico existente na região. A realização deste potencial no entanto, depende da demonstração da viabilidade comercial (técnica e econômica) do uso da biomassa, no caso madeira, como fonte primária para produção de eletricidade, objeto do Projeto WBP/SIGAME.

Além das entidades brasileiras citadas acima, participam deste projeto as seguintes entidades internacionais: Global Environmental Fund - GEF, United Nations Development Program - UNDP, World Bank - WB, bem como fornecedores internacionais de equipamentos e consultoria: BIOFLOW, Termiska Processer AB - TPS, General Eletric - GE e a Jaakko Pöyry Engenharia - JPE. Além destes participantes diretamente envolvidos, diversas instituições tem acompanhado o projeto, na qualidade de observadores técnicos, como a COPERSUCAR.

A gestão do Projeto apoia-se em uma estrutura gerencial definida num Memorando de Entendimentos assinado por todos os participantes e pelo MCT, que define os compromissos e obrigações de cada participante. O MCT assumiu formalmente, perante o UNDP, o compromisso de implementar o Projeto, através de um Conselho Diretor (CD), presidido por um representante desse Ministério e composto por um representante de cada participante. O CD atua através de uma Gerência de Projeto, cuja responsabilidade está a cargo do representante da CHESF e, de Grupos de Trabalho (GT) criados para executar tarefas específicas. Estes GT's são formados por profissionais alocados pelos participantes no projeto ou por seus próprios representantes no CD.

Figura 1. Esquema da planta de demonstração do Projeto WBP/SIGAME

O Projeto WBP-SIGAME: aspectos técnicos

O Projeto WBP/SIGAME compreende a implantação de uma planta de demonstração com capacidade de cerca de 30 MW, esquematizada na Figura 1. Para sua viabilização e exploração comercial prevê-se a constituição de uma entidade jurídica, de preferência de caráter privado, consorciando os atuais participantes e futuros sócios que porventura venham a participar do empreendimento. A planta de demonstração está sendo concebida para ser usada como módulo de futuras unidades comerciais, cuja potência deverá situar-se entre 60 MW e 100 MW.

Descreve-se a seguir a operação nesta planta, que deveraser instalada no interior do Estado da Bahia. A conversão da energia da biomassa em eletricidade, desconsiderando as diferenças entre os sistemas de gaseificação (pressutizado/atmosférico), se inicia na área de recebimento de madeira, cujo objetivo é armazenar a madeira em forma de toras recebida das florestas e produzir cavacos com granulometria adequada à gaseificação. Parte da madeira recebida será encaminhada diretamente para a alimentação da linha de picagem e parte deverá ser armazenada para os períodos quando não houver abastecimento de combustível, sendo sempre movimentada com gruas móveis. Após a mesa alimentadora, as toras seguem por transportadores de correia e rolos para transformação em cavacos no picador de tambor, passando antes por uma estação de lavagem e detecção de metais. Uma área a céu aberto recebe os cavacos vindo do picador que são transportados por correias transportadoras, para estocagem em pilhas.

De acordo com a necessidade, os cavacos são retomados da pilha e seguem para o secador de cavacos, onde se utilizam os gases de combustão para reduzir a umidade de biomassa de 35% para a faixa de 10 a 20%, aumentando assim a eficiência da planta e possibilitando que o gás, gerado no sistema de gaseificação, possa ser queimado na turbina a gás. O secador opera em fluxo cruzado com os gases quentes provenientes de caldeira de recuperação, que entram no fundo do secador e atravessam o leito de biomassa, promovendo a secagem dos cavacos.

Os cavacos secos alimentam o gaseificador juntamente com o ar e em uma reação de combustão incompleta, tem-se a geração do gás combustível. Posteriormente o gás é resfriado, purificado e enviado a turbina a gás onde é queimado na câmara de combustão e posteriormente expandido, gerando assim a energia mecânica necessária ao acionamento do compressor e do gerador elétrico acoplados a turbina. Os gases da exaustão da turbina passam através da caldeira de recuperação de calor onde geram o vapor que alimenta o turbogerador a vapor. A turbina a gás a ser utilizada é do tipo aeroderivada, de fabricação GE, modelo LM 2500, modificada para a queima de gás com baixo poder calorífico (cerca de 1.400 kcal/Nm³). As principais alterações devem ser efetuadas na câmara de combustão, no sistema de controle e no sistema de extração de ar para alimentação da planta de gaseificação. Além disso, devido a menor relação ar/combustível nesse caso, comparativamente à de um combustível fóssil, impõe maior área de passagem dos gases na expansão, para uma mesma potência, devendo assim ser utilizada uma turbina prevista para operação com injeção de vapor, porém sem que haja tal injeção. A descarga do turbogerador a vapor ocorre em um condensador arrefecido com água proveniente da torre de resfriamento. O condensado produzido volta ao sistema de água de alimentação da caldeira, onde também ocorrem as reposições de perdas com água desmineralizada.

A energia elétrica é produzida em geradores independentes, um para cada turbina, os quais alimentam um barramento no nível de tensão de 13,8 kV. Nesse barramento encontram-se ligados, por meio de disjuntores, o transformador elevador de tensão para a rede 13,8/69 kV (subestação principal) e transformadores auxiliares para alimentação da usina que rebaixam a tensão para os níveis de 4.000V e 400V. A interligação da linha de transmissão com o transformador principal também é feita via disjuntor.

As principais informações técnicas sobre a planta do Projeto WBP/SIGAME son:

Capacidade instalada: 30 MW
Eficiência: 43%
Tipo de ciclo: Ciclo combinado
Fator de capacidade previsto: 80%
Produção anual de energia: 210.240 MWh
Consumo de combustível: 0,75 t/MWh, 0,98 m³ solidos/MWh

É notável o efeito da produtividade florestal sobre a área plantada e a energia anual produzida por área, como pode-se ver:

Produtividade florestal

20 m³/ha.a

30 m³/ha.a

Área plantada

10.290 ha

6.890 ha

Energia produzida

20 MWh/ha.a

30 MWh/ha.a

Em termos de custo unitário, a previsão atual está da ordem de 2000 $EE.UU./kW para a unidade de demonstração, incluindo os estudos preliminares, com expectativas de que se reduza a 1.300-1.500 $EE.UU./kW em escala comercial. Como um apêndice à este trabalho se apresentam os resultados de alguns estudos de custos para esta tecnologia, cujos resultados são similares à faixa anterior. Assim, para uma planta de 30 MW, espera-se que o custo com a tecnologia madura seja entre $EE.UU. 39 a 45 milhões. Sob tais condições, em operação comercial, tal planta deverá apresentar um custo unitário de energia da ordem de 39 a 47 $EE.UU./MWh. Naturalmente que este custo é bastante influenciado pelo custo da lenha e pelo fator de capacidade considerado.

O Projeto WBP/SIGAME foi concebido para ser desenvolvido essencialmente em cinco fases, listadas a seguir:

1. Estudos iniciais (julho/91 - julho/92)

2. Desenvolvimento de equipamentos; engenharia básica e infra-estrutura institucional (julho/92 - dezembro/95)

3. Implantação

4. Operação em regime de demonstração

5. Operação comercial

Objetivando melhores resultados, foi introduzido o princípio da competitividade no desenvolvimento do projeto, através da adoção da filosofia denominada "Two Leg Approach", que consistiu no desenvolvimento simultâneo de dois projetos básicos, baseados em duas tecnologias de gaseificação eoneorrentes, uma pressurizada (BIOFLOW) e a outra atmosférica (TPS), devendo ser adotada a última delas tendo em vista seu grau de maturidade e o razoável desempenho atingido. Antes da definição do tipo de gaseificador a ser adotado, avançou-se no projeto preliminar do ciclo térmico (GE e a Jaakko Pöyry).

Como informam os responsáveis, toda infra-estrutura, requerida para a efetiva implementação do projeto, encontra-se implantada e em pleno funcionamento e as atividades que formam seu núcleo estão em fase final de desenvolvimento. Atualmente o maior interesse dos participantes está na formação do consórcio, entidade que deverá ser responsável pela implementação da Fase III.

A Tabela 1 a seguir apresenta o orçamento do projeto, em $EE.UU. milhões, para suas três primeiras fases. Para as Fases IV e V os recursos necessários ainda não foram definidos.

Tabela 3. Orçamento do Projeto WBP/SIGAME

Fases

Previsto

Comprometido

Realizado

Fase I

0,15

0,15

0,15

Fase II

7,7

7,9

5,9

Fase III

70

-

-

Aspectos ambientais

Como qualquer outra atividade humana, a utilização de biomassa florestal para a produção de energia elétrica em larga escala certamente interferirá no meio ambiente, contudo a determinação dos possíveis impactos demandará estudos mais detalhados, que deverão ser feitos quando da análise de projetos específicos na parte florestal e na de conversão de energia. Apesar disso, algumas previsões já podem ser feitas levando-se em consideração as informações e a experiência obtidas por empresas florestais.

Na área florestal, os possíveis impactos negativos durante as fases de implantação, crescimento e exploração são: uso excessivo de produtos químicos (fertilizantes, pesticidas), erosão do solo, modificações das condições do habitat natural e compactação do solo através do uso intensivo de tratores e caminhões. Certamente que estes impactos podem e devem ser atenuados. Dentre os aspectos ambientais positivos, destaca-se a absorção do carbono da atmosfera, ajudando a regular a quantidade de CO2 existente e, conseqüentemente, contribuindo para reduzir o efeito estafa. Além da absorção do CO2, o controle da erosão do solo e das funções hidrológicas, a restauração de ecossistemas degradados, redução dos níveis de assoreamento dos rios e reservatórios, estão entre os possíveis impactos positivos.

Pode ser bastante relevante o fato da biomassa produzida de modo sustentável servir como um atenuador da emissão de carbono, sobretudo quando se discute internacionalmente a penalização dos combustíveis fósseis com taxas crescentes com sua emissão específica de carbono ("carbon tax"). Para se dar uma idéia da importância que esse imposto poderá vir a ter, as discussões em torno do valor a ser estipulado variam entre $EE.UU. 15,00 e $EE.UU. 400,00 por tonelada de carbono retido. Para uma área com produtividade florestal de 20 m³ sólido/ha.a, que retém só na parte aérea da floresta, cerca de 15 toneladas de carbono por hectare, esse imposto poderá vir a representar, para uma usina de 30 MW, um aporte de recursos de até $EE.UU. 51 milhões, com significativa influência em sua rentabilidade. Observese que os valores acima não levam em consideração o efeito de substituição, ou seja, o carbono que deixou de ser lançado na atmosfera em função da não utilização de combustíveis fósseis para gerar a mesma quantidade de energia (Cunha Filho et alli, 1995 e Leão et alli, 1995).

Perspectivas e oportunidades

Com razão consideram os responsáveis pelo Projeto WBP/SIGAME, que independente dos resultados que se venha a obter, este projeto será uma das principais referências em futuras decisões, relativas ao aproveitamento da biomassa como fonte primária de energia, nesta escala de capacidade e visando eficiências elevadas. Se for mal sucedido, este projeto provavelmente se constituirá numa barreira ao desenvolvimento de novas iniciativas, independente do mérito das mesmas. No entanto, se bem sucedido, certamente será um forte elemento de motivação a que novas iniciativas sejam tomadas nessa área. Neste caso as perspectivas são promissoras e um leque de oportunidades pode ser apontado para o futuro (Cunha Filho et alli, 1995 e Leão et alli, 1995).

Tecnicamente, o sucesso comercial do conceito de geração empregado no Projeto WBP/SIGAME, viabilizará a abertura de um novo e amplo mercado, tanto na área de serviços como de bens duráveis, equipamentos e sistemas energéticos e florestais. Esse será um forte argumento para que outras empresas de disponham a investir, para estar presente nesse novo mercado. A competição entre os diversos interessados deverá resultar em menores custos e maiores eficiências, e portanto em benefícios globais para a esta tecnologia em relação as suas concorrentes.

As conseqüências do sucesso do deste projeto, em termos econômicos, serão função do grau de penetração dessa tecnologia e poderão se dar a nível local, ou seja, na área de influência de um determinado projeto, ou em termos mais amplos, a nível regional. Localmente, a criação de novos empregos resultará num maior fluxo de recursos, que se bem aproveitado, certamente trará benefícios à comunidade. Em termos regionais e dentro de uma perspectiva de longo prazo, a utilização desta tecnologia poderá resultar, numa sensível redução dos investimentos requeridos para suprir as suas necessidades de energia elétrica, em um elevado número de novos empregos, principalmente na produção florestal e na intensificação do fluxo econômico nas regiões do interior.

Bibliografía

ASSUMPÇÃO, R.M.V. 1981. Gaseificação de madeira e carvão vegetal - princípios e aplicações, in Uso da madeira para fins energéticos, CETEC, Belo Horizonte

CHESF/BRASCEP. 1987. Fontes Energéticas Brasileiras: inventário/tecnologia, 4 volumes sobre biomassa, Relatório Técnico OPE 006-IME041, BRASCEP Engenharia Ltda., Rio de Janeiro

CUNHA FILHO, H.F.; LEÃO, A.J.H.C; CARPENTIERI, E. 1995. Um caso prático da aplicação da tecnologia BIG-GT (Biomass Integrated Gasification - Gas Turbine), visando o aproveitamento de biomassa para produção comercial de eletricidade, XIII Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, ELETROSUL/CIGRÉ, Camboriú

D'ÁVILA,S.G.; MAKRAY, Z.T. 1981. Gaseificadores de madeira - aspectos técnicos e econômicos, in Uso da madeira para fins energéticos, CETEC, Belo Horizonte, 1981

HAMRICK, J.T. 1992. The Biomass fueled Gas Turbine, Global Gas Turbine News, vol. 32, n°3, IGTI-International Gas Turbine Institute, Atlanta

KURKELA, E.; SIPILA, K.; SOLANTAUSTA, Y. 1991. Power production from biomass by simplified IGCC processes-research activities in Finland, First European Forum on Electricity Production from Biomass and Solid Wastes by Advanced Technologies, Editors: Grassi, G.; Bertini, I., Commission of the European Communities, Florence

LEÃO, A.J.H.C., CARPENTIERI, A.E., CUNHA FILHO, H.F., BRITO, R.B. 1995. Metodologia para desenvolvimento de novas tecnologias aplicadas ao setor elétrico: caso exemplo, Projeto WBP/SIGAME, XIII Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, ELETROSUL/CIGRÉ, Camboriú

NOGUEIRA, L.A.H.; BORTOLAIA, L.A.; NASCIMENTO, M.A.R. 1995. Ciclos Térmicos com Biomassa Gaseificada: configurações e desempenhos, XIII Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, ELETROSUL/CIGRÉ, Camboriú

WALTER, A.C.S.; BAJAY, S.V.; NOGUEIRA, L.A.H. 1994. Simulação e Análise da Operação de Sistemas de Cogeração G-GT em Usinas de Açúcar e Álcool, ENCIT-94/Encontro Nacional de Ciências Térmicas, Associação Brasileira de Ciências Mecânicas, São Paulo

WILLIANS, R.H.; LARSON, E.D. 1993. Advanced-Gasification based Biomass Power Generation, in Renewable Energy: Sources for Fuels and Electricity (ed. Johansson, T.B.; Kelly, H.; Reddy, A.K.N.; Willians, R.), Island Press, Washington

Apêndice

Estimativas de custos para usinas termelétricas com geseificacão de biomassa e turbinas a gás

Como se trata de uma tecnologia ainda em desenvolvimento e sem unidades comerciais em operação, são possíveis apenas estimativas para os indicadores econômicos, geralmente baseadas no projeto WBP/SIGAME apresentado neste trabalho. Apresentam-se a seguir alguns valores tomados da literatura a respeito, em sua paioria convergindo para a faixa entre 1300 a 1500 $EE.UU./kW de capacidade instalada.

1. ELETROBRÁS. PLANO 2015, Oferta de Energia Elétrica: Tecnologias, Custos e Disponibilidade/Sub-projeto 4 - Biomassa Florestal. ELETROBRÁS, 1993, Rio de Janeiro.

Custos estimados para produção elétrica a partir da biomassa, utilizando turbinas a gás

Tecnología

Custo de capital ($EE.UU./kW)

Custo de geração ($EE.UU./MWh)

Incidência da biomassa sobre o custo total (%)

G-GT ciclo simples

1.140

43,7 a 77,7

52 a 77

G-GT ciclo combinado

1.500

41,4 a 69,4

34 a 60

G-STIG

1.330

38,3 a 66,3

42 a 63

2. Paisley, M.A.; Litt, R.D.; Overend, R.P.; Bain, R.L., Gas Turbine Power Generation from Biomass Gasification, ASME COGEN-TURBO/94, International GasTurbine Institute, IGTI-vol. 9, Portland, 1994.

Para uma UTE de 56 MWe, estes autores estimaram um custo de capital de 1.400 $EE.UU./kWe, correspondendo 21% ao sistema de gaseificação, e sob condições típicas de operação (FC=0,9), resultou um custo de geração de 56,3 $EE.UU./MWh, correspondendo 29% ao custo do combustível.

3. Newhall, J.L.; Folson, B.A.; Taylor; D.G.; Kirchgessner, D.A.; Martin, G.B., Biomass Combustion in Gas-Turbine Systems, ASME COGEN-TURBO/92, International Gas Turbine Institute, IGTI-vol. 9, Houston, 1992

Estes autores analisaram economicamente diversas configurações de UTE's com biomassa gaseificada e apresentaram a seguinte tabela de resultados, para um custo do combustível de 1,42 $EE.UU./GJ.

Configuração da UTE

"heat rate"
(kJ/kWh)

Custo de capital
($EE. UU./kW)

Custo de geração
($EE. UU./MWh)

Ciclo

Gaseificador

Limpeza dos gases

Simples

Pressurizada

A quente

10.648

1.415

70

Simples

Pressurizada

A frio

12.566

1.320

70

CC

Atmosférica

A frio

11.817

1.962

91

CC

Pressurizada

A frio

9.437

1.552

72

STIG

Pressurizada

A frio

10.199

1.457

70

STIG

Atmosférica

A frio

13.030

1.246

68

4. Schmoe, L.A.; Lennox, F.H., Gasification Combined Cycle Economics, ASME COGEN-TURBO/92, International Gas Turbine Institute, IGTI-vol. 9, Houston, 1992

Estes autores avaliaram as perspectivas de redução de custos em ciclos com turbinas a gás e gaseificadores integrados, e concluíram que os níveis de 1450 $EE.UU./kW, estimados para 1996, poderão reduzir-se a 1400 $EE.UU./kW até 2006, devido ao efeito de escala na produção e ao incremento do desempenho dos sistemas.

5. Consonni, S.; Larson, E.D., Biomass-Gasifier/Aeroderivative Gas Turbine Combined Cycles: Part B-Performance Calculations and Economic Assessment, ASME COGEN-TURBO/94, International Gas Turbine Institute, IGTI-vol. 9, Portland, 1994

Estes autores avaliaram quatro configurações consideradas promissoras de ciclos BIG-STIG e apresentam uma tabela com resultados de 7 trabalhos, desenvolvidos entre 1990 a 1994, com valores extremos entre 1170 a 2370 $EE.UU./kW, mas recomendam a faixa 1230 a 1420 $EE.UU./kW para as unidades comerciais baseadas na LM2500 e gaseificação atmosférica, baseando-se em estudos da Shell para o Brasil.


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