Em um grande país, com diferentes zonas climáticas e grande variedade de águas interiores, a pesca artesanal de importância local havia se desenvolvido anteriormente em associação com povoamentos dispersos. Havia muitas unidades econômicas pequenas, sem relação direta umas com as outras. Com o desenvolvimento do Brasil nas duas últimas décadas, a expansão da maioria de suas grandes cidades e a criação da rede rodoviária, praticamente todos os recursos importantes têm agora acesso aos mercados de maior relevo, tendo se desenvolvido complexa economia de pesca interior que necessita de orientação central. A SUDEPE é o órgão indicado para assumir essa liderança e promover a integração da economia da pesca interior com a da pesca marinha.
Para exercer suas funções de orientação, a SUDEPE necessitará de informações e serviços de ciência de pesca e deverá cobrir todo o Brasil. No que diz respeito ao crescimento conjunto da economia da pesca interior, poderia também ser conveniente unificar os institutos e postos pesqueiros da SUDEPE (novos e já existentes), instituições universitárias e das usinas hidroelétricas, instituições de pesquisa e piscicultura a serem criadas posteriormente, fazendasmodelo de peixe etc., em um só mecanismo de pesquisa e desenvolvimento. Isso poderia ser realizado criando-se um grupo especial de cientistas, um comitê ou conselho, no qual pudessem ser examinados os programas de cada instituição, que seriam também contrabalançados um com o outro, em favor de uma política global de pesquisa e desenvolvimento, com o objetivo específico de evitar duplicação do trabalho e falhas essenciais na informação geral. Deve entender-se que não se sugere seja criado um quadro científico com funções de autoridade sobre as instituições locais de pesquisa. Ao contrário: para ser eficiente, cada instituto deve ter o máximo de autonomia possível para escolher os objetivos de pesquisa dentro da área geográfica ou do assunto para o qual foi criado, por exemplo, trabalho de pesquisa, que é também determinado pelas necessidades da pesca local. No entanto, o proposto comitê (ou conselho) teria importante papel no planejamento da multiplicidade de informações necessárias ao país inteiro, provenientes das numerosas instituições espalhadas pelo território nacional, responsabilizando-se também pela compilação dos dados recolhidos.
A formação de jovens cientistas para as novas instituições pesqueiras, por meio de cursos breves em disciplinas relacionadas com a pesca, foi uma solução de emergência, cujo resultado ainda não pode ser previsto. Uma política de desenvolvimento da pesca e da piscicultura, a longo prazo, necessita de programa também a longo prazo para formação de uma equipe, que deveria incluir pessoal acadêmico de pesquisa, pessoal administrativo de nível superior, bem como pessoal técnico não-acadêmico. Não é possível treiná-los por meio de estágios, como aos piscicultores para administrar criadouros, postos pesqueiros e fazendas de peixe etc. Esse programa deverá ser dinâmico, ou seja, adaptável às necessidades. Para a equipe de nível acadêmico, serão obrigatórios cursos de idiomas, para que se mantenham a par do progresso internacional no campo de sua especialização.
Já não é mais necessário explicar que uma política global de desenvolvimento da pesca interior e da aquacultura necessitaria, também, de legislação uniforme e regulamentação local baseadas nos mesmos princípios. A regulamentação local, em áreas geograficamente distantes ou em diferentes sistemas fluviais pode, naturalmente, variar no que diz respeito aos detalhes. A piscicultura será, sem dúvida, isenta de regulamentação de pesca em suas águas artificiais, excetuando a regulamentação sanitária.
Para a execução bem sucedida de uma política uniforme e global de desenvolvimento da pesca interior e da piscicultura, será preciso criar alguns serviços novos sob os auspícios da SUDEPE;
Os recursos da pesca interior podem ser melhor explorados economicamente pela pesca artesanal; a piscicultura também é mais econômica no nível artesanal. O sucesso de uma política de desenvolvimento da pesca interior e da piscicultura depende, em grande parte, da eficiência dessas profissões. Sua formação e promoção encontram-se oficialmente sob o controle do Plano de Assistência à Pesca Artesanal - PESCART, uma organização especial sob o Ministério da Agricultura. Estreita colaboração entre a SUDEPE e o PESCART deve ser mantida, com o objetivo de formar pescadores profissionais altamente treinados, educados e economicamente independentes.
4.7.1 - Pesca Interior
Deve dar-se máxima prioridade, no momento, às atividades destinadas a tornar operacionais todas as novas instituições pesqueiras, bem como outras instalações de pesquisa, a fim de que seja possível obter, rapidamente, uma avaliação do potencial das águas interiores, naturais e artificiais.
Esses esforços devem ser imediatamente apoiados pela coleta intensiva de todas as informações estatísticas, iniciando-se ao mesmo tempo o estabelecimento de um serviço de estatística, que é um projeto a longo prazo.
Simultaneamente, deverá ser feita uma revisão da legislação e regulamentos pesqueiros.
Todas as outras atividades, que visem a estabelecer uma política uniforme de desenvolvimento da pesca interior, deverão estar de acordo com os resultados do levantamento de recursos e poderão ser abordadas posteriormente.
4.7.2 - Piscicultura
Em vez de promover a produção incontrolada da tilápia nos tanques, deve ser ensinada a piscicultura com peixes nativos, dando-se ênfase à administração de fazendas de peixe no ambiente rural. Enquanto os proprietários de tanques e as instituições pesqueiras não estiverem em condições de produzir o número suficiente de alevinos para efetuar o peixamento dos tanques de produção, eles precisam ser capturados no ambiente natural. A criação de carpas é possível, desde que seja racionalmente administrada. Toda iniciativa privada, no campo da piscicultura, merece apoio imediato e, eventualmente, assessoria. Fazendasmodelo de peixe, para elaboração de métodos adequados de administração e para estudar as suas implicações econômicas, devem ser estabelecidas logo que possível:
para as áreas rurais, com base na produtividade natural de solos que seriam, de outra forma, inutilizáveis, e
nas áreas vizinhas às cidades, na base de alimento artificial.
Considerando a magnitude e complexidade das tarefas envolvidas com a criação de uma política uniforme de pesca e aquacultura, em comparação com o reduzido pessoal disponível, pareceria útil solicitar auxílio e orientação, durante um período de 5 anos, por intermédio da assistência técnica do PNUD, ou de outras agências.
Essa assistência técnica poderia ser implantada de várias maneiras, para as quais são esboçadas três alternativas:
Projeto A
Alguns técnicos independentes são designados para vários assuntos e áreas geográficas distintas, por exemplo, em Manaus, Belém, Cuiabá (Pantanal), Bananal e Pelotas. Todos deverão ser biólogos de pesca, especializados em água doce, e proporcionarão orientação à equipe de jovens pesquisadores brasileiros, assim constituída: 3 pesquisadores em Três Marias, para estudar os reservatórios hidroelétricos, um baseado em Pirassununga, para tratar de todos os problemas relacionados com a piscicultura e um em Pelotas para introduzir a piscicultura com o peixe-rei. Esse projeto necessitaria de 10 técnicos, por um período de 2 a 4 anos.
Projeto B
Um pequeno projeto central deveria ser implantado para assessorar e auxiliar a sede da SUDEPE na execução de suas funções centrais, por exemplo:
planejamento da estrutura e do desenvolvimento da economia da pesca interior, incluindo a integração da piscicultura e coordenação com a economia da pesca marinha;
planejamento e organização dos serviços de estatística, informação e controle;
planejamento e coordenação da pesquisa;
organização da formação e treinamento de pessoal;
promoção da profissão de pescador e formação de piscicultores profissionais.
Esse projeto necessitaria de 4 a 5 técnicos, por um período de aproximadamente 3 anos, isto é, 2 economistas de pesca para o trabalho descrito nos ítens a e b; 1 ou 2 biólogos de pesca para as atividades assinaladas em c e d; e 1 extensionista para as atribuições constantes no ítem c.
Projeto C
Sugere-se um projeto maior, porém descentralizado, próximo à sede da SUDEPE, com pequena equipe de ligação e administração e vários grupos de técnicos, nos vários centros, por um período de 4 a 6 anos.
O projeto seria organizado da seguinte maneira:
O escritório central do projeto consistiria de 1 director, 1 administrador e pessoal de escritório;
1 técnico seria designado para cada um dos centros em Belém, Manaus e Cuiabá, a fim de proporcionar orientação aos grupos de pesquisadores jovens;
1 grupo de pesquisa, composto de 3 limnologistas de água doce e biólogos de pesca, trabalharia em conjunto no centro do Bananal;
1 grupo de pesquisa, integrado por 4 técnicos, seria designado para Três Marias, para estudar os vários reservatórios hidroelétricos da área. O grupo começaria com 4 limnologistas (lagos) e biólogos de pesca, que seriam substituídos posteriormente (um a um) por um técnico em petrechos de pesca, um economista e um extensionista, logo que uma pesca profissional começar a se desenvolver;
1 grupo de pesquisa de três limnologistas e biólogos de pesca trataria da exploração da lagoa em Pelotas;
5 aquacultores trabalhariam em diferentes partes do país, por exemplo, 1 em Pirassununga (para o desenvolvimento da aquacultura no Estado de São Paulo); 1 em Pelotas (para trabalho com o peixe-rei e eventualmente também com o camarão); 1 em Itabuna (sul da Bahia) para ostra, tainha, peixes de rio e cultivo do camarão, planejado pelos fazendeiros; 1 em Propriá (baixo São Francisco, para produzir peixes de rio em tanques); 1 em Natal (Rio Grande do Norte, para auxiliar no desenvolvimento de culturas da tainha e do camarão). Para essa sugestão, seriam necessários 20 especialistas.
A última das três possibilidades poderia ser a mais eficiente, considerando-se a escassez de cientistas no Brasil.