FAO in Portugal

Lei de Bases para o Direito Humano à Alimentação Adequada está em discussão na Assembleia da República

10/04/2019

Lisboa - Está em discussão neste momento na Assembleia da República um projeto de lei para a criação de uma Lei de Bases do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas em Portugal. O projeto de lei, apresentado pelo Bloco de Esquerda, foi a votação no parlamento no dia 7 de fevereiro, e encontra-se agora em fase de apreciação e audições públicas no âmbito da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar.

Para Francisco Sarmento, chefe do Escritório da FAO em Portugal, o projeto de lei preenche uma lacuna importante:

“A Constituição da República Portuguesa não reconhece o Direito Humano à Alimentação Adequada. Este reconhecimento reforçaria a necessidade de desenvolvimento de uma política nacional e abrangente para enfrentar os desafios multidimensionais que existem nesta área. Uma lei de bases tem, ainda, o potencial para dar instabilidade institucional aos avanços já registados em Portugal nos últimos anos, pois torna esta questão uma política de Estado e não de governo. Nessa perspetiva, o sistema de segurança alimentar e nutricional em início de montagem pelo atual governo, incluindo o CONSANP, serão consolidados, evitando retrocessos. Estas são políticas que requerem tempo e estabilidade para dar frutos e são, portanto, pouco compatíveis com mudanças governativas de curto e médio prazo”.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, a qual Portugal subscreveu, consagra, no seu artigo 25º, o direito humano à alimentação. Contudo, e apesar das significativas conquistas relativas a esta questão, dados recentes revelam que 10,1% dos portugueses têm dificuldade de fornecer alimentos suficientes a toda a família e 2,6% das famílias experimentam situação de insegurança alimentar moderada ou grave.

A este cenário, deve-se acrescentar o problema do excesso de peso, que atinge 5,9 milhões de portugueses, e as doenças que resultam da má alimentação, como por exemplo a diabetes, que teve um aumento de 80% na última década e hoje atinge 10% da população, com custos que atingem cerca 20% do orçamento total do Sistema Nacional de Saúde. É igualmente importante destacar as consequências ambientais decorrentes do atual sistema alimentar, que contribuem para as preocupações atuais na sociedade portuguesa, justificando assim a mobilização para este tema.

Atualmente, são 30 os países por todo o mundo, que reconhecem explicitamente o Direito Humano à Alimentação Adequada, como o Brasil, Colômbia, Equador, Egipto, Quénia, Guatemala, México, África do Sul, e outros.

Para Flávio Valente, Secretário-Geral da FIAN International entre 2007 e 2015, "a decisão de Portugal de avançar em direção à criação de uma Lei de Bases para o Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas é alvissareira porque reafirma o caráter pioneiro do povo português em defesa da plena realização de todos os direitos, com ênfase aos direitos humanos económicos, sociais, culturais e ambientais. Ao mesmo tempo, reafirmaria o compromisso do povo português com a garantia do direito à alimentação e nutrição para todos, para além do combate a fome, incluindo o direito humano à comida de verdade, de qualidade, nutritiva, culturalmente adequada e sem venenos."

Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional em Portugal

No dia 13 de março, realizou-se a primeira reunião do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional de Portugal (CONSANP). Presidida pelo Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Luís Capoulas Santos, esta reunião representa o primeiro passo do órgão criado através da Resolução do Conselho de Ministros nº 103/2018, cujos principais objetivos passam por potenciar a concretização do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) em Portugal e contribuir para a definição de uma visão integrada das matérias relativas à segurança alimentar e nutricional, garantindo a convergência, a coerência e a participação social.

O CONSANP, integra representantes de vários ministérios e entidades ligadas à temática da alimentação em Portugal, como organizações de agricultores, da indústria alimentar, de ordens profissionais, da sociedade civil e de defesa do consumidor, da academia, e outras, garantindo assim uma abordagem intersectorial entre os vários organismos, necessária para a concretização da garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada.

A criação do CONSANP está integrada no objetivo global de melhorar a governança para a promoção de sistemas alimentares mais sustentáveis e responde igualmente ao compromisso assumido por Portugal no seio do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP.