FAO in Mozambique

Cheias causam grandes estragos no Centro e Norte de Moçambique

"Não temos comida suficiente e temo que a situação piore nos próximos dias", disse A. Maurício
20/02/2015

"A minha casa ficou inundada. Não consegui salvar quase nada. As panelas, as roupas, os cobertores – tudo foi com a água." Admira Maurício tem 29 anos, é mãe solteira. A casa de barro, onde vivia com os filhos em Nicoadala, ruiu, a sua machamba continua alagada.

O distrito de Nicoadala fica na Zambézia, centro de Moçambique, uma das províncias mais gravemente afectadas pelas cheias do início deste ano. Fortes chuvas e inundações nos rios Zambeze e Licungo levaram a que, no passado dia 12 de Janeiro, o Governo de Moçambique emitisse um alerta vermelho para as regiões centro e norte do país. Comunidades e mesmo distritos inteiros ficaram isolados, o acesso às populações locais tornou-se o maior obstáculo à distribuição de bens essenciais.

Ao fim de nove dias de avaliação das necessidades no terreno, que terminou esta quinta-feira (19.02.), a equipa da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) confirma a situação local: "tivemos de percorrer longas distâncias por picadas semi-destruídas. As estradas estavam cortadas e algumas comunidades continuam apenas acessíveis de barco, bicicleta, mota ou mesmo a pé", afirmou Jacinto Mutambe que integrou pela FAO a equipa de avaliação. "Muitas pessoas perderam as suas machambas, instrumentos agrícolas, animais de criação. Muitas perderam as suas casas e os bens acumulados ao longo da vida. E muitas outras perderam as suas fontes de rendimento", acrescentou Felicidade Panguene, que também integrou a equipa de avaliação por parte da FAO.

Até agora, cerca de 160.000 pessoas, mais de 33.000 famílias, foram afectadas, cerca de 45.000 encontram-se temporariamente deslocadas. Devido às cheias dos rios, às chuvas intensas e ao desabamento das suas casas, 158 pessoas morreram, entre elas 134 na Zambézia. Já no início da emergência, esta província contava com 49 centros de acomodação temporária como o de Nicoadala, onde se encontra Admira. São mulheres como ela e meninas que estão em situação particularmente vulnerável, enfrentando o risco de violência e infecção com HIV. Devido à falta de alimentos e, em muitos casos, à perda de todos os meios de subsistência das famílias, o casamento prematuro organizado constitui também uma ameaça. Por isso, e porque as mulheres desempenham um papel crucial na agricultura de subsistência e no garante da segurança alimentar das famílias, os projectos que a FAO irá implementar terão as mulheres, entre outros grupos vulneráveis, como foco de especial atenção.

A equipa de emergência da FAO coordenará, ao longo dos próximos seis meses, a distribuição de sementes de cereais e de hortícolas bem como ferramentas agrícolas nas províncias da Zambézia e Sofala. Parceiros da FAO serão o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar (MASA), os governos locais, organizações não-governamentais e organizações baseadas na comunidade. O objectivo da missão será apoiar as famílias beneficiárias (ao todo 11.000) na recuperação da produção agrícola.

"Perdi tudo, os meus animais, a minha machamba. Não tenho comida nem trabalho. Tudo aqui está dependente de como a água vazar. Se demorar a vazar, vai ser uma tragédia. Haverá fome, muita fome", disse Edson Pequeleque, 54 anos, um pai de seis filhos que, tal como Admira, se encontra no centro de acomodação de Nicoadala. Esta situação não é nova para Alberto Chidiamassamba, que está a coordenar a equipa pela FAO. O perito já cobriu outras situações de emergência e conhece a realidade local: "perder as culturas já semeadas significa para estas famílias perder as colheitas e, portanto, a disponibilidade de alimentos. Isto, por sua vez, representa, para muitos, insegurança alimentar", afirmou.

Segundo Jacinto Mutambe, as palavras-chave mais mencionadas foram precisamente 'alimentos' e 'sementes', o que significa "uma grande responsabilidade para nós como FAO e para o cluster de segurança alimentar da ONU, que co-lideramos com o Programa Mundial para a Alimentação (PMA), que tem de intensificar o seu trabalho de coordenação e mobilização de recursos tanto a nível nacional como a nível local".

A intervenção da FAO em situações de emergência desenvolve-se em três fases: serviço de alerta rápido, avaliação de impacto, que está agora a terminar, e recuperação a médio prazo, que terá início brevemente.