Programa de Cooperação Internacional Brasil-FAO

Técnicos da Argentina conheceram a prática ancestral do tingimento natural de algodão preservada pelas mãos de artesãs da Bolívia

O tingimento com elementos naturais é uma herança entre gerações na cultura Chiquitana.

Foto: Zulma Soto/FAO

Santa Cruz, Bolívia, 28 de abril de 2022 - "Nossa cultura é o fio de algodão e o tingimento natural", disse a artesã boliviana María Posiva, presidente da associação APIASERTUR, durante o II Workshop para a troca de experiências sobre o tingimento natural do fio de algodão, realizado nos dias 22 e 23 de abril, em San Antonio de Lomerío, na Bolívia. 

Esta segunda edição do workshop, promovido pela Prefeitura de San Antonio de Lomerío, contou com a presença de representantes do Instituto Tecnológico Agrário Nacional (INTA) e da Secretaria de Agricultura Familiar, Camponesa e Indígena, ambas instituições argentinas. O projeto +Algodão acompanhou a atividade por meio da sua área de mercados. O projeto é executado em conjunto pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores (ABC/MRE) e sete países parceiros, incluindo a Bolívia. 

Troca de saberes ancestrais

A formação foi ministrada pela artesã María Posiva, acompanhada por outras 14 artesãs do Centro Madre del Niño e da associação APIASERTUR, que é composta por cerca de 50 integrantes de San Antonio de Lomerío e que têm o trabalho focado no artesanato com o fio de algodão. 

As artesãs bolivianas dividiram seus conhecimentos sobre a técnica ancestral de tingir fios de algodão com elementos encontrados na natureza, 100% natural, uma herança da cultura indígena ´Chiquitana´. Foi uma oportunidade para o artesanato da Bolívia e da Argentina se conectarem, trocando conhecimentos e práticas desenvolvidas nos dois países, numa perspectiva de revalorização do algodão e de respeito à natureza, valorizando o papel fundamental desempenhado pelas mulheres cotonicultoras e empreendedoras na manutenção do saber ancestral. 

Na opinião da artesã Julia Chuve, da Bolívia, o trabalho de tingimento não é tão simples, pois é necessário o acesso à água, à lenha e aos 'ingredientes' extraídos da natureza como raízes, caules, frutos, folhas e sementes. Trata-se de uma técnica transmitida entre gerações que, segundo a artesã, “graças ao conhecimento e à cultura deixados pelos nossos antepassados, é possível dar continuidade a este trabalho. Os aprendizados que nos deixaram como netas”, destacou. 

Os representantes do INTA, Doriana Feulliade, e Federico Pognante, da Secretaria de Agricultura Familiar também compartilharam o trabalho realizado em seu país com mulheres artesãs e produtoras, por meio da Rede Argentina de Mulheres Algodoeiras. A Rede é formada por 12 organizações de famílias agricultoras, fiandeiras e tecelãs. Aspectos de gestão organizacional da produção têxtil e sua comercialização foram temas compartilhados. 

Doriana Feulliade avaliou a experiência como muito importante: “Aprendemos passo a passo a técnica de tingimento natural desde a preparação das tinturas a partir de folhas, cascas, frutos, sementes e folhas colhidas do meio natural local, até a sua secagem à sombra”. Segundo o extensionista rural, foram encontradas semelhanças entre os dois países, como as práticas de tingimento semelhantes e os desafios nos aspectos organizacionais e mercadológicos, processos históricos comuns entre os povos indígenas. “Encontramo-nos no comum do feminino, a situação da mulher na sua tríplice função de cuidado reprodutivo, desempenho produtivo e papel fundamental na participação comunitária”, sublinhou o extensionista que concluiu: “Individual e coletivo. Nós nos capacitamos porque construímos confiança.” 

Na 'volta para casa', Federico Pognante, da Secretaria de Agricultura Familiar, Camponesa e Indígena, explicou que todo esse conhecimento ancestral da cultura Chiquitana será compartilhado com as 120 mulheres integrantes da Rede Argentina. 

A equipe também levou para seu país amostras de fibras de algodão de diferentes variedades de cores para realizar uma análise de qualidade no laboratório do INTA para que, posteriormente, os resultados sejam entregues à equipe do projeto +Algodão. 

+Algodão

Na Bolívia, o projeto + Algodão foi implementado entre 2017 e 2021, quando uma série de ações foi desenvolvida em conjunto com os ministérios de Desenvolvimento Rural e Terra (MDRyT) e Desenvolvimento Produtivo e Economia Plural (MDPEP). Apoiou o fortalecimento do artesanato boliviano, em San Antonio de Lomerío e outras organizações departamentais e nacionais. Em 2021, apoiou o I Workshop de tingimento natural do algodão para técnicos e técnicas da Empresa Nacional de Serviços Têxteis (SENATEX), e promoveu a participação de artesãs em feiras nacionais para divulgar seus tecidos de algodão com identidade.